Gostaria de começar essa página brindando-os com o texto a seguir do Professor Dr. Roberto Patrus da FDC, um dos grandes mestres em ÉTICA desse país. Talvez achem que já é muito antigo, mas está mais atual do que nunca. Foi publicado em fevereiro de 2006 no site www.responsabilidadesocial.com sob o título “Ética nos negócios e nas organizações da sociedade civil”.
Esse texto expressa a visão que carrego na gestão da ABAG, na Coalizão, em minha empresa particular, na que sou o CEO e naquelas em que exerço o papel de conselheiro, sejam ONGs ou privadas. Aproveitem!
ÉTICA NOS NEGÓCIOS E NAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL (prof. Dr. Roberto Patrus)
Não é raro que a ética nos negócios seja comparada com “espelhos para elevador”, como fazem Llano e Zagal, autores de um livro sobre o tema. Contam eles que, em um luxuoso prédio comercial, os usuários se queixavam continuamente da lentidão dos elevadores. Quando se estava a ponto de trocar todo o maquinário por um melhor, mais moderno e mais caro, surgiu a ideia de se colocarem espelhos no hall onde se aguarda o elevador. As pessoas começam a se ver, o tempo se ocupa e se elimina a sensação de espera. De acordo com a metáfora, a ética estaria sendo introduzida nas empresas mais para tranquilizar as consciências do que para promover aperfeiçoamentos morais.
A ética pode ser definida como a reflexão acerca dos valores e critérios que determinam a escolha de uma conduta considerada correta. Ao escolher uma conduta que se considera a melhor, é papel da ética clarificar os valores que determinaram essa escolha. A finalidade da escolha ética é promover o bem comum, o que pode ser resumido em três alvos: não prejudicar ninguém, não deixar que ninguém o prejudique e não se prejudicar.
Podemos perguntar se, no mundo dos negócios, é possível escolher condutas boas sem prejudicar ninguém, sem se prejudicar e sem deixar que o outro o prejudique. A empresa (ou mesmo uma organização do terceiro setor) se relaciona com diferentes públicos (empregados, governo, comunidade, fornecedores, concorrência, acionistas) e suas ações podem beneficiar ou prejudicar esses públicos, inclusive indiretamente, por meio, por exemplo, de ações que afetam o meio-ambiente. Como parâmetro para fundamentar uma ética no mundo dos negócios (extensiva às organizações da sociedade civil), valemo-nos de um modelo de ética nos negócios, composto de três dimensões: a responsabilidade, a convicção e a virtude.
A dimensão da responsabilidade implica na noção de que toda ação da organização afeta pessoas ou grupos sociais, ou seja, os públicos com os quais se relaciona. A responsabilidade implica em prever os resultados das ações. No mundo dos negócios, um dos resultados que se espera das ações de uma organização é o lucro, ou, no caso das organizações de terceiro setor, o retorno financeiro para a manutenção e ampliação das suas atividades. Hoje em dia, essa finalidade econômica é compartilhada pela finalidade social (promoção de melhorias sociais para empregados e comunidade, principalmente) e pela finalidade ambiental (preservação do meio-ambiente e respeito às futuras gerações). A dimensão da responsabilidade reúne o tripé econômico-social-ambiental da sustentabilidade, não só da organização, mas do mundo em que vivemos.
A dimensão da convicção implica na adoção de valores de humanidade que, de algum modo, limitam a busca dos resultados estrategicamente planejados. Nem todos os caminhos são válidos para cumprir as metas estabelecidas. Uma organização ética preocupa-se com os resultados sim, mas sabe o que não deve fazer para realizá-los. Nesse sentido, a ética da convicção é um limite para a ambição da empresa ou da organização da sociedade civil. Esse limite só se realiza se a empresa debate os meios para o alcance dos seus fins. Um código de ética corporativa deve ser acompanhado de reflexão e treinamento contínuos, a fim de que a organização crie o seu jeito ético de fazer negócio.
A dimensão da virtude é a disposição firme e constante para a prática do bem. As decisões de uma organização são decisões de pessoas. Lideranças éticas promovem o hábito de fazer a coisa certa em cada processo decisório, o que exige coragem, virtude.
Ora, a ética de uma organização não se reduz à ética da responsabilidade, pois os resultados nem sempre justificam a violação de princípios éticos. Não se reduz, também, a uma ética da convicção, pois a defesa de valores legítimos pode ter consequências que invalidam a sua intenção. Não se pode desprezar o impacto das decisões em cada um dos públicos da empresa, o que seria irresponsabilidade. Desconsiderar os resultados das ações no processo de tomada de decisão não é apenas ingenuidade, é má gestão. Finalmente, a ética da virtude também não se basta para a formulação de uma ética organizacional. Crer que pessoas virtuosas formam uma organização virtuosa é um exemplo de falácia da composição, classicamente ilustrada pelo seguinte proposiçã se todas as peças de uma máquina são leves, logo a máquina é leve.
A empresa é mais do que as pessoas que a integram. Ela é a soma de processos, tecnologias, culturas e pessoas.
Enfim, o modelo de ética organizacional aqui apresentado exige a articulação integrada entre responsabilidade (resultados), convicção (valores) e virtude (modo habitual da organização agir). A ética nos negócios é uma forma de gestão e deve estar imbricada na cultura e nos processos administrativos, tecnológicos e decisórios de uma organização. Seu foco é a organização. Sem gerir a cultura organizacional, sem aperfeiçoar os processos, sem aplicar os valores definidos e sem desenvolver as pessoas, a ética nos negócios será mero discurso, desarticulado da prática cotidiana. Será como um espelho no hall de um elevador.
Parabéns pelo trabalho desenvolvido Marcello...precisamos, cada vez mais, de bom senso para que tenhamos um desenvolvimento, pelo menos, com mais justiça, na nossa região.